sábado, 27 de outubro de 2012

Aquela que é banhada por Apolo


Uma mulher com seus trinta e poucos anos. Sim, uma mulher jovem, alta, de cabelos negros e lisos, pele alva, lábios finos, magra, olhos verde-escuros e de beleza singular, está sentada num pequeno sofá, para duas pessoas, marrom-escuro e de braçadeiras largas, apresentando – aparentemente – almofadas fofas e bem estofadas. Enquanto isso, a mulher beberica pequenos goles do café preto que está contido numa xícara de “pseudo - porcelana” com vários protótipos de Papai Noel grafados.
Detalhe: todos os “Papais Noéis” estão abraçados e no desenho parecem entoar uma canção natalina. Seria uma canção destinada às pobres criancinhas que ficam sem Natal? Que mal possuem um carrinho de madeira para brincar? A comunhão simbólica entre Papais Noéis representaria isso, uma apologia? Bem, acho que não. Acho que quem projetou o gráfico da xícara apenas desejava um desenho bonitinho.
Retorno a me concentrar na mulher.
Deixou sua xícara sob uma mesinha de centro, feita de madeira e de coloração marrom-escura, que combina com o sofá. Ela ergue o rosto – rosto bonito apesar de alguns sinais de expressão apontarem que a idade já a cerca – e parece preocupada, aflita, incomodada com algo. Seria com a cor da cozinha nova? Não posso saber, apenas posso especular e o que se passa na cabeça dela não é relevante neste momento.
O olhar dela percorre toda a sala, observando rapidamente os vasos de flores ali presentes. Não sei que flores são, mas posso dizer que uma delas é vermelha e muito bela. Já a outro, creio eu, é chamada “Jiboia”.
A luz do sol incide, ainda, fracamente acima das plantas e não apenas acima delas, mas também delineia o rosto da mulher a qual agora parece uma boneca de porcelana triste, com seus grandes olhos verdes chorosos e sua boca curvada para baixo e mesmo com os últimos raios solares a atingirem seus cabelos, ela é uma imagem fria e mórbida; um quadro. Mostra a beleza fúnebre dela e a tristeza dentro de seu globo ocular, fazendo com que me recorde do “Mal do Século” ou “Romantismo”, o que dá no mesmo, com Álvares de Azevedo e seus pesares de menino.
Os olhos dela se erguem e notam que eu tomo diversas outras “notas” sobre ela. É tempo de acabar.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Fragmentação da chaleira imaginária e devaneios consecutivos

Já não tenho mais certeza do meu amanhã
                                              [nunca o tive
A chaleira, chia, ferve, entra em ebulição
Vai se transformando em microscópicas nuvenzinhas de gotículas de vapor d'água
Ouço o som delas lutando contra o cativeiro que a panelinha incute

Divago.

Penso que muitos de nós permanecem em cativeiros,
Ricocheteando nas paredes invisíveis do que nos aflige e escraviza.
Agoniza.
Quem vos fala não sou eu mesma, não pretendo fazer mais rodeios
E quem injetou em mim a droga alucinógena natural,
Agora prende minha mão contra seu peito
Aproxima o rosto e o encosta no meu seio,
Sussurrando palavras inaudíveis - invadem minha zona neural! -
                              - Talvez, meu bem...
Escravos...
Ebulição!
Chama!
Queima!
Explosão!
Gritos!

Não vou mais te ver...
Por enquanto...
                         - Eu te quero tanto...




domingo, 14 de outubro de 2012

Calcifica e depois adocica

Eu não sirvo pra poesia
A prosa é minha amiga
Então por que componho versos?
Pela beleza?
Nem sonoridade consegui colocar!
Ó tristeza!
Inspiração, invade-me e toma as rédeas
Injeta nesse cérebro - em curto circuito - um pouco do óleo;
O óleo da criatividade!
Aproveita e ensina-a a amar,
Para que este coração não seque nem finde pela falta de ar

Caranguejo

Lamento pelos meus modos.
Lamento não conseguir te mostrar o que há de bom.
Lamento lamentar tanto nos teus ouvidos.
Lamento minha ignorância sobre o amor.
Lamento meu egoísmo e minha falta de empatia.

Do meu melhor restam apenas gestos bruscos e palavras ácidas.
Lamento ser esse ser; ser eremita provida de casca e garras.

Para alguém como eu.

Nosso principal problema é cansar de tudo muito rápido; meu principal problema. Ficar se reinventando, não para agradar aos outros, mas para se sentir renovada, é um saco. Um mal necessário para quem sente que está faltando algo; para alguém que procura coisas novas; para alguém que cansa de si mesmo; para alguém como eu.

Ao Inferno

Dane-se que você não goste!
A sua opinião já não tem mais importância.
E aí se eu faço algo errôneo?
Mais vale a tentativa.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Libido

Menos sobriedade!
E viva à libertinagem
Transformando o sexo em seriedade!
Rostos reluzentes
Em busca desse prazer entorpecente
Querendo fugir da prisão de seus corpos
Refugiando-se no tesão
E implorando pelo perdão do objeto,
Cujo coração latente
Desespera, bate e rui num abismo em expansão!
Sugai o mel do ventre cálido
E não reivindicai pelo tempo desperdiçado
Em prazer libidinoso

domingo, 7 de outubro de 2012

Eu (quase) te amo

Matar é inaceitável à civilização
E amar, indispensável
Mas o que fere mais?
Amar ou matar?
Amar é nadar em rios açucarados,
Saturados de ilusões!
Matar é dar nós aos cabos;
É findar com as decepções.
Então, por que me matas?
Mata-me com sorrisos afiados,
(Teu olhar me atravessa como uma faca)
E abraços apertados
Mata-me como aqueles que erguem a espada
Arrancando o coração
Da virgem intocada!
Mata-me de amor...
- Pelo menos, assim, eu sorrio.


sábado, 6 de outubro de 2012

Presente

Não declame seus problemas para mim!
O tempo aqui é muito curto para que se reclame!
Escrevo.
Escrevo versos livres desprovidos da beleza
E quem dera se eles tivessem a pureza do teu olhar!
Escreva.
Escreva nem que seja para mim!
À mim, tua eterna ouvinte
Que lhe afaga e adocica
E a quem tu apunhala
Num delírio fotoquímico!

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Ao Meu Estranho


Desgastado dessa vida - da mesma forma que o tempo e o vento corroem as rochas
Talvez lhe faltem realidades;
Duras e mórbidas

Os sorrisos - os teus sorrisos
São falsos e gélidos
Sombrios

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Menina do nanquim ou insana do divã?



Eu nunca consigo terminar nada do que começo, pois tudo se torna complicado a partir daqui. Nada se desenrola com a mesma facilidade que costumava antigamente e o vazio é o pior inimigo de nós, seres humanos. Afinal, é ele que nos corrói aos poucos, fazendo com que fiquemos remoendo coisas de um passado distante; coisas sem motivos para recordar; coisas que deveriam estar enterradas – muito bem enterradas, diga-se de passagem – ficam vindo à tona na minha mente e sem qualquer intervalo.
Descansar de mim mesma tornou-se uma tarefa árdua. Procuro uma solução para o que me deixa neurótica (ah, essa sociedade), mas quando penso... Qual é a solução que busco? Seria viver uma vida vazia? Livre de emoções intensas? Não tenho ideia e talvez seja por isso que estou aqui.
Bem na verdade começo a pensar que talvez seja necessário um manual para reaprender a viver.
Ninguém gosta que isso seja tão complicado, mas – depois de certo tempo – tudo se perde no infinito deserto das lembranças. E a areia não cobre os verdadeiros “tesouros”. Cave um pouco e você verá que deveria ter feito uma cova de sete palmos se o seu desejo era enterrar o lhe afligia.
 Eu me sentia desgastada e estava começando, literalmente, a enlouquecer com o que estava (está ainda) acontecendo.
Um grito mudo – sufocado – na minha garganta não me deixava respirar e eu, assim como todos os seres vivos, necessito de gás oxigênio no sangue. O problema é que eles não me deixavam respirar; não me deixavam pensar; não me deixavam agir. Enquanto eu planejava a minha fuga dessa jaula invisível, eles aperfeiçoavam suas técnicas de aprisionamento.
De fato, como tudo, começou em perfeito estado. Comigo não foi diferente, mas com a consciência e o tempo, degringolou. Não resisti às verdades e de certa forma me orgulho por isso; orgulho-me por não ser mais uma peça pré-fabricada. Toda a “verdade” que nos rodeia não é substancialmente verdadeira, nós é que enfeitamo-la um pouco, tornando-a aceitável para a maioria.
Sim. Mesmo quando queremos contar a verdade findamos por mentir, omitindo – ou transformando – aquilo que realmente traria diferença. E por quê?
Essa é uma pergunta que ainda não sou capaz de responder. Sejamos sinceros: somos todos egoístas e mentirosos. Eis aí algo que posso afirmar com toda certeza.
No entanto, está no juízo de cada um tornar-se ou não um bom mentiroso. Não podemos confiar nem em nós mesmos, pois mentimos para o nosso “eu” constantemente com a finalidade de amenizarmos situações desagradáveis.
 E essa técnica? Realmente funciona?
Estou tentando usá-la há tempos, mas nunca consegui resultados muito bons. Uma pena. Por que será que é tão mais fácil vivermos, e convivermos, na sombra da mentira?
Quando um de meus maiores desejos é de ir para o sol e deixar que todos os seus raios, toda sua luminosidade penetre a minha pele. Quero me sentir libertada de todos os males; quero poder chorar lendo um simples livro sem ser tachada de ridícula e quero sim tomar um banho de chuva quando sentir vontade.
Isso é incorreto?
Começo a pensar que sim. Essa maldita sociedade que tenta nos moldar à seu modo sem nos deixar o livre arbítrio.
Conceber essas verdades, mesmo que intima e secretamente, faz com que o nó comece finalmente a derreter de minha garganta, deslizando como elegantes bailarinas.
Eu sei, eu sei. Nada disso faz sentido, mas quem lhes disse que precisava haver nexo nisso tudo?
Trata-se de pensamentos soltos no papel e os “vocês” referem-se a mim mesma, aos meus próprios pensamentos.  Eu tenho ao menos o direito de me expressar?
Sim? Se sim, obrigada.
Respostas prontas ficam acumuladas como saliva dentro da nossa boca e o pior é que quanto mais tento me livrar delas, reformulando novas respostas, mais elas se apegam a mim. E não vai demorar muito para quererem controlar até mesmo quantas batidas o nosso coração estará “liberado” para dar a cada minuto ou quantas vezes poderemos expirar e inspirar por hora.
A questão é que ainda não compreendi o motivo pelo qual estou registrando esses pensamentos “vomitados” de forma caótica sobre o papel; “Menina do nanquim ou insana do divã?”, minha avó me indagou certa feita e eu não soube o que responder.
Deveria dizer meu nome? Caso eu resolva falar, digo o verdadeiro ou crio um pseudônimo? Criando um pseudônimo caio na minha teia, naquela hora em que afirmo querer fugir das sombras da mentira. Humpf! Está certo. Sou Alice, mas qual é a importância de um nome? Ele não vai me definir ou definir minhas ações.
Ações... Há tantas coisas que gostaria de ter feito diferente, mas há outras tantas que sei que faria igual e, mesmo assim, se eu não tivesse feito nada do que fiz nos últimos anos, certamente não estaria quem sou hoje.
Provavelmente, seria mais uma dessas pessoas vazias que não pensam em nada além de si mesmas e outras futilidades, mas também não precisaria estar aqui agora. Talvez eu fosse feliz, mesmo sendo uma felicidade falsa e superficial.
- Alice?
Caralho! Quem é a jumenta que está interrompendo minha linha de raciocínio?!
- Sim?
- Pode entrar. A Dra. Narcisa já está disponível e aguarda por você – a secretária sorri largamente.
- Ah sim, obrigada – retribuo o sorriso.
Prestes a entrar na sala de uma das pessoas mais odiosas que conheço: minha psiquiatra. Ela é um exemplo perfeito da futilidade humana, pois é uma criatura que odeia a profissão e desestimula os pacientes. Bem sei que ela quis tornar-se psiquiatra apenas para que pudesse ter o título de “Doutora” e sempre recebendo as pessoas com seu sorrisinho falso e nojento. Eis aqui um exemplo em que o nome determina a pessoa: “Narcisa”. É isso que ela é, uma porra de uma narcisista nojenta que pensa ser superior a todo o restante do planeta só porque possui PhD em Psiquiatria.
E lá vem ela de braços abertos e com seu maldito sorriso me receber. Como eu queria a ver sorrir com todos os dentes quebrados. Só venho até esse inferno – duas vezes por semana – porque meus pais me obrigam e não apenas meus pais, assim como toda minha família. Eles pensam que eu tenho graves problemas mentais.
- Olá Ali, como foram seus últimos dias?
- Pra começo de conversa, não quero lhe falar sobre como foram os meus dias e não me chame de “Ali”; não lhe dei intimidade para tanto.
- Lamento se a ofendi, mas você sabe que meu dever é ajudar quem precisa...
- Por isso mesmo. Você “ajuda” necessitados e como eu não sou uma “necessitada”, então, por favor, Doutora, me poupe de seus discursos sem fundamento.
- Mas...
- Por favor, sente-se e finja fazer algo de construtivo enquanto eu como seus biscoitos amanteigados.
- Eu tenho outra opção?
- Óbvio! Nós sempre temos outras opções. Que pergunta mais imbecil. Tsc, e isso que você é PhD enquanto eu sou apenas uma pirralha de dezesseis anos que está no terceiro ano do ensino médio. Esses biscoitos são realmente muito bons! – Narcisa me observa espantada. Normal, essa é sempre a reação dela – E isso que eu não acrescentei que estudo em escola pública.
- É justamente isso que não consigo compreender. Você é tão madura... Como foi ficar assim, menina?
- Assim como? Eu enxergo além, muito além. Todavia, isso é problema meu e meus motivos para ficar desse jeito são todos frutos dessa sociedade distorcida.  Admito, essa foi uma boa tentativa de penetrar na minha mente, mas, infelizmente, acho que não irá funcionar comigo. Portanto, desista.
- Está bem, mas quando você quiser se abrir comigo, estarei à sua disposição.
- Pode esperar deitada e já desfrutando de um bom sono. Já é muito o fato de estarmos conversando. Dê-se por satisfeita.
- Alice, você tem personalidade antissocial. Tens consciência do que isso acarreta? Estou aqui tentando ajudá-la! Deixe-me fazer meu trabalho! Você é a pessoa mais fechado que conheço.
- E você é a pessoa mais vazia e fútil que já conheci. Comprando títulos e vendendo diagnósticos precipitados.
Minha voz se inflama e Narcisa parece desconfortável em sua poltrona vermelho sangue, estofada com plumas, talvez?
- O seu “diagbóstico” é bastante visível: sim sou antissocial! Parabéns, Narcisa! Você fez o seu trabalho!
- Escuta Alice...
- Sabe de uma coisa doutora? Eu já vou indo, porque está na minha hora e sinceramente? Os biscoitos estavam fabulosos. Adeusinho!
Saio da sala com um sorriso cínico, o mesmo o qual todos somos condicionados a usar. Sinto-me satisfeita hoje e acho que minha terapeuta descobriu algumas coisas sobre ela mesma.

Boca, mel e a tua mente

O olhar oblíquo
Reluzente! Brilhante!
Retomando o passado longínquo
Daqueles andantes;
Passantes que entornavam o líquido rubro resplandecente
E agora teu contemplar
Declara não passar do meu alucinar
E nisso caio em contradição
Procurando um saída desse labirinto;
O labirinto do teus lábios
(Lábios sábios)
E com o gosto de absinto
(Ainda nos lábios)
Perdi-me
E no frenesi de libertar-me
Encarcerada encontrei-me
E que prisão deliciosa
(Teus lábios)
Me oportunizaram

E não me digas: "más despácio"!


Riso Escarlate

O tédio me corrompe
E numa fuga alucinada
Meu corpo desaba no horizonte
Calcificada; entorpecida; negligenciada.

E deslumbrada com a Aurora adormecida,
Permaneço estagnada
Remando num Mar de Lama
Lutando contra o que me prende na cama

De repente, um estouro
A respiração segue ofegante
E nesse mesmo rompante
Recobro a memória selada entre anéis de ouro

Surpresa é você estar no meio delas
Tão vivo e escarlate
O que me faz pensar se não era disso que eu precisava:
Bocas entrelaçadas
Tão vivas, tão unidas, em meio a risos... risos?
Só risos escarlates




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